FORMA CONVIDATIVA
Entende-se por forma convidativa a forma que mais possui afinidade com as pessoas. Segundo Hertzberger, os projetos devem ser adequados a cada situação a qual estão inseridos, devendo ser, em outras palavras, não apenas confortável, mas também estimulante, sendo esta adequação designada como forma convidativa. Em se tratando de Belo Horizonte, para exemplificar esse termo, escolhemos as entradas dos mercados Central e Novo, que demonstram uma diversidade peculiar em quantidade e em qualidade de cores, fontes e tipologias, bem como os diversos caminhos da praça Raul Soares, sendo um meio arquitetônico a estimular o usuário a experimentar de diferentes formas o ambiente.
URDIDURA E TRAMA
Urdidura e trama remetem à tecelagem: a urdidura são os fios longitudinais que estabelecem o ordenamento básico do tecido, ela serve de base, enquanto a trama são os fios que dão cor, textura, padrão ao tecido. Em "Lições de Arquitetura”, Hertzberg cita o plano de Le Corbusier para Argel: a grande estrutura como urdidura, com cada unidade de moradia dentro dela livre para a expressão do morador.
No trajeto, os mercados, central e novo, podem ser vistos como exemplos de urdidura e trama: ambos possuem uma estrutura geral que delimita os espaços individuais de cada loja, mas cada loja assume a sua própria identidade, criando a multiplicidade de formas e expressões encontradas nesses locais.
ARTICULAÇÃO ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO
É a dialética entre coletivo e individual, entre o acessível a todos, de responsabilidade coletiva, ou o acessível a apenas um determinado grupo, que tem a responsabilidade de mantê-lo.
No trajeto, vemos no Edifício JK, na praça Raul Soares, um exemplo dessa gradação: o pátio visto na imagem a seguir logo abaixo do prédio funcionaria como um espaço que dialoga entre o público e o privado, sem domínio definitivo, mas foi cercado. Se não houvesse as grades, o espaço iria dialogar mais com público, permitindo que qualquer um o acessasse, mesmo que a responsabilidade direta fosse ainda do privado. A cerca foi instalada no ano de 2015, e se dá também como reflexo da insegurança vivida nas grandes cidades brasileiras, o que não é levado em conta na obra de Hertzberg, que considera mais a realidade europeia. O espaço que antes trabalhava com a relação público-privado agora se isola majoritariamente como espaço privado.
IRREGULARIDADES
O ambiente citadino, especialmente devido a aspectos culturais, sociais e espaciais, engloba uma série de irregularidades no que tange aos formatos, aos componentes, às construções em si, aos relevos distintos, entre outros elementos que refletem a multipolaridade de um único espaço urbano. Nesse contexto, segundo Hertzberger, as irregularidades não devem ser superadas, uma vez que refletem um processo contínuo e complexo da formação de cada mínimo ambiente que compõem a superfície. Isso, em uma análise mais ampla, deve ser visto como uma oportunidade de exploração do espaço, de sua heterogeneidade e, por consequência, de sua riqueza visual, utilitária e conceitual. Logo, a obra que lemos busca instruir o leitor a enxergar o que o rodeia com olhos abertos e curiosos, abrindo mão da tendência de homogeneização e de padronização comuns no mundo atual.
Associando tal estudo ao nosso trajeto de Belo Horizonte, é possível identificar alguns exemplos que ilustram o que foi dito. Inicialmente, a diferença de altura entre o Mercado Novo e as demais instalações comerciais traz uma sensação de pomposidade. Ainda, a planificação da Praça Raul Soares traz destaque a essa região e, através das diferentes cores (do verde da vegetação, do marrom do concreto e do colorido das construções em volta) e do formato em mandala de seu gramado, com uma fonte no meio, o ambiente é de fácil visualização e apreciação.